Joias,
carros de luxo e fazendas. O ganho obtido por milicianos com a exploração de
serviços em comunidades da Região Metropolitana do Rio de Janeiro está sendo
investido em regiões bem distantes das favelas dominadas por este grupo. É o
que mostram investigações da Polícia Civil, do Ministério Público estadual e
processos na Justiça do RJ aos quais o G1 teve acesso.
A quarta reportagem da série
Franquia do Crime mostra que um chefe de milícia foi preso com R$ 56 mil em
joias. Outro homem apontado por agentes como sendo um chefe miliciano comprou
uma fazenda de um político da Região Serrana do RJ. No local, ele tinha até
animais exóticos.
A fazenda foi descoberta
após um trabalho conjunto entre a Delegacia de Repressão às Ações Criminosas
Organizadas (Draco) e o Laboratório de Lavagem de Dinheiro da Polícia Civil do
Rio de Janeiro. No inquérito, policiais apuram a compra de uma fazenda em
Sapucaia, no Norte Fluminense, por Marco Figueiredo, conhecido como Marcos
Catiri, investigado por chefiar uma milícia na Zona Oeste do Rio.
Atualmente, Catiri figura
como acusado em dois processos: um por organização criminosa na Vara Criminal
de Bangu, e outro por posse de arma e receptação no juízo criminal de Sapucaia.
Ele responde em liberdade.
De acordo com policiais,
Catiri comprou a fazenda que já pertenceu a um ex-prefeito de Teresópolis. O
político não é investigado pela Polícia Civil. Os investigadores querem
entender a intermediação de um empresário da Baixada Fluminense no negócio. Em
operação no local, os policiais encontraram emus, araras, avestruz, cavalos de
raça e um lago com pedalinho.
No interior da casa, também
foi encontrada uma escopeta de fabricação turca e um colete à prova de balas.
Atualmente a propriedade está lacrada. Policiais da Draco investigam se a
fazenda foi comprada com dinheiro adquirido com extorsões a moradores de
comunidades. Os investigadores já descobriram que a quadrilha cobra R$ 1 mil
por semana de motoristas de vans que circulam no bairro de Bangu, na Zona Oeste
do Rio.
Em uma ação de busca e
apreensão, os policiais apreenderam anotações numa cooperativa de vans de
Bangu. Na documentação, há a comprovação de que o pagamento do aluguel de um
apartamento no condomínio Ocean Front, na Barra da Tijuca, era feito pela
cooperativa. Para os policiais, isso indica influência de Marquinho no
transporte.
Mais de R$ 56 mil em joias
Em 24 de fevereiro deste
ano, policiais da Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam) de Niterói prenderam
Horácio Souza Carvalho, apontado como um dos chefes da milícia da Praça Seca,
na Zona Oeste do Rio. A região ganhou a atenção de autoridades da Segurança
Pública do RJ porque, desde dezembro, vem sendo alvo de disputa entre
milicianos diariamente.
De acordo com investigações
da Draco, a milícia local "rachou" levando a confrontos quase que
diários. Segundo policiais que prenderam Horácio, no momento da prisão, ele
ofereceu dinheiro para ser libertado. Preso por formação de quadrilha,
corrupção ativa e organização criminosa, o criminoso foi encontrado em um
apartamento na Barra da Tijuca.
As joias que usava foram
apreendidas e encaminhadas ao Instituto de Criminalística Carlos Éboli (ICCE).
Uma perícia preliminar avaliou o cordão de ouro que Horácio usava em R$ 40 mil.
Cada anel que ele usava custa R$ 8 mil cada um.
Camaro e mala com R$ 150 mil
Há um ano, policiais da
Draco prenderam Cleber de Oliveira Silva, chamado de Clebinho, que pertenceria
a uma milícia instalada em Santa Cruz. O criminoso estava em um apartamento na
Avenida Lúcio Costa, na Barra da Tijuca.
Na garagem, os policiais
encontraram um Camaro, avaliado em R$ 150 mil. Ao revistarem o veículo, os
investigadores encontraram uma mala com R$ 180 mil em dinheiro.
Em um processo que transita
pela 42ª Vara Criminal, o Ministério Público estadual pede o perdimento do
valor e venda dos veículos – ainda foi apreendida uma Hilux na operação – em
favor do Estado do RJ.
As investigações apontam que
Clebinho usou um "laranja" para adquirir o veículo. Em sua defesa,
ele alega ser dono de um posto de gasolina, mas a polícia descobriu que o local
não está no nome de Clebinho. Uma perícia do ICCE no apartamento encontrou
ainda R$ 180 mil em joias.
Exploração de areia
Investigações da Polícia
Civil e do Ministério Público estadual mostram que uma das maiores milícias do
Rio investe na exploração de saibro. O empresário responsável pelo negócio é
Luís Antônio da Silva Braga, irmão de Wellington da Silva Braga, o Ecko,
procurado por chefiar a milícia com influência em Campo Grande, Paciência,
Santa Cruz, Cosmos e Inhoaíba.
Ecko assumiu o grupo após a
morte de outro irmão, Carlos da Silva Braga, o Carlinhos Três Pontes. De acordo
com promotores do Ministério Público, Luiz Antonio é o sócio da Macla Extração
e Comércio de Saibro. Luiz Antonio foi preso pela Draco em 2015 acompanhado por
dois seguranças – um deles policial militar. O empresário acabou liberado no
Plantão Judiciário.
Em depoimento no Ministério
Público, um miliciano, preso em 2016, que não teve o nome divulgado, apontou a
extração de areia e saibro como uma das atividades mais rentáveis do grupo. A
empresa de extração de saibro fica no bairro Jardim das Acácias, em Seropédica,
justamente uma das localidades onde a milícia se instalou no município.
No depoimento, o miliciano
citou ainda que a milícia de Campo Grande seria proprietária de um depósito de
gás e de uma loja de venda de baterias para carro.
Os métodos de cobrança de
comerciantes e a organização dos grupos são bastante parecidas – tanto nas
"franquias", como são chamadas as milícias oriundas da antiga Liga da
Justiça, quanto na matriz, principalmente na Zona Oeste. Os cadernos de
cobrança apreendidos pela Polícia Civil e pelo Ministério Público,
respectivamente em Campo Grande e Seropédica, revelam o nível de organização e
os lucros da facção criminosa.
Em Campo Grande, a 35ª DP,
quando prendeu Alexsandro Bruno da Conceição, de 36 anos, apreendeu livros de
cobranças de duas ruas de Campo Grande: as estradas da Cachamorra e do Moinho.
As duas ficam a 3,2 km uma da outra.
Nas cobranças da Estrada da
Cachamorra há 83 estabelecimentos, de borracheiros a bares. Esse comércio rende
à milícia de Campo Grande um valor semanal de R$ 2.435.
Na estrada do Moinho, nada
muito diferente: são, pelo menos, R$ 2.595 por semana, de vários
estabelecimentos. Alguns, como uma loja de material de construção e um mercado,
pagam R$ 250 aos milicianos de "taxa de segurança".
No Km 40, em Seropédica, o
material utilizado é mais antigo: um caderno, apreendido pelo MP, tem como data
das apreensões o dia 3 de outubro de 2016. Do lado esquerdo da BR-465, antiga
Rio-São Paulo, em um dos cadernos, calculava-se R$ 2.630 de arrecadação para os
milicianos a cada semana. Do lado direito, em apenas uma das páginas do caderno
de cobranças, a via registrava mais R$ 1.350.
Fonte : G1
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