Quando
Martín Silva pegou três pênaltis do Jorge Wilstermann e garantiu o Vasco na
fase de grupos da Libertadores, talvez o cruz-maltino que mais comemorou tenha
sido o presidente Alexandre Campello. Não só pela natural torcida pela equipe
independentemente do cargo administrativo, mas por tudo o que aquelas três
defesas significaram para o futuro do clube na temporada.
Campello assumiu o Vasco no dia 23 de janeiro, em meio a
uma crise financeira: salários atrasados, elenco insatisfeito e pouca previsão
de receitas. Desde então, traçou metas. A principal delas, talvez, seja
equilibrar o caixa cruz-maltino até 2020, último ano de mandato. E o plano
seria bastante prejudicado.
Não só a diminuição das receitas do Vasco com premiações
e bilheteria preocuparia Alexandre Campello, mas a situação do elenco comandado
pelo técnico Zé Ricardo e as reações da torcida. Por ir à fase de grupos, o
Cruz-Maltino já garante 1,8 milhão de dólares (600 mil dólares por partida em
casa).
- Difícil dizer, mas seria muitíssimo mais difícil.
Primeiro, porque traria uma instabilidade e descontentamento dentro do próprio
elenco, apesar de este grupo ter provado que é maravilhoso. (Os jogadores) são
unidos e dedicados. Mas poderia levar à instabilidade. O humor da torcida
certamente mudaria. Além da perda de receita, porque temos premiações com as
passagens de fase. Isso nos ajuda a honrar nossos compromissos. Teria sido
muito ruim. São muitas coisas por trás daquelas defesas do Martín - diz
Campello.
O presidente do Vasco recebeu o GloboEsporte.com em sua
sala em São Januário nesta quinta-feira. O papo, de cerca de 40 minutos,
abordou tudo: os projetos para os próximos anos, as contas do clube, reforços
para a Libertadores, patrocínio, relação com Eurico Miranda, presidente do
Conselho de Beneméritos...
De bate-pronto, porém, Campello estabeleceu equilibrar as
contas do Vasco até 2020, último ano de seu mandato, como uma das principais metas
da gestão.
- Já diminuímos as despesas, e não foi só com corte de
funcionários. Fizemos ajustes inclusive no elenco. Eu diria que nossas ações
vão reduzir ao longo do ano entre R$ 15 milhões e R$ 20 milhões. Estamos
fazendo o dever de casa. Outros ajustes ainda serão feitos. (...) Nossa ideia é
sobreviver com dificuldade em 2018, melhorar em 2019 e em 2020 ter capacidade
de maior investimento. Não se transforma esse cenário da noite para o dia.
Veja, abaixo, os principais trechos da entrevista exclusiva
com o presidente do Vasco:
GE: Você está há pouco mais de um mês no cargo. O que
mudou na sua vida quando se tornou o presidente do Vasco?
Campello: Minha vida profissional não mudou muito,
continuo atendendo, operando. Agora com um horário mais restrito. Só adaptei a
agenda. Antes tinha bastante horário livre, uma vida tranquila, e agora tenho
um comprometimento muito grande com o Vasco. Passo 10h, 12h por dia no clube.
Ou dentro de São Januário ou em reuniões fora daqui. Normalmente chego após o
almoço e não tenho hora para sair.
Qual era o panorama do Vasco quando você sentou na
cadeira de presidente no primeiro dia de seu mandato?
Quando você assumiu, existia a expectativa da entrada de
verbas grandes, como o pagamento referente a Philippe Coutinho e ao patrocínio
da Lasa. E este dinheiro até agora não entrou nos cofres do clube...
Em parte não se concretizaram, em parte foram postergadas
e divididas. Nós vamos receber o dinheiro do Philippe Coutinho, mas em três
vezes. A previsão é de recebermos a primeira até a sexta da semana que vem.
Neste período, tivemos algumas receitas menores, como uma parte que vem da TV,
arrecadação de bilheteria e algumas outras.
Como foi o processo fracassado com a Lasa? Qual sua
participação?
Quando assumimos, o contrato já estava assinado. Para ter
início no dia 31 de janeiro. Então, não havia o que fazer, apenas aguardar o
pagamento. Próximo disso, fizemos contato com o presidente da empresa para
tratar da ativação. Vieram ao Rio às vésperas do jogo contra o Flamengo e,
inclusive, foram ao jogo conosco. Conversamos e ficamos esperando o dinheiro.
No dia 31 ele nos procurou e falou que estava com problema com fluxo de caixa,
que era um investimento que viria de fora do país.
Ele pediu até o dia 14, e nós decidimos esperar. Ainda
demos uma folga até a sexta, dia 16. Nesse período, falamos algumas vezes e ele
deu algumas justificativas. Depois do dia 16, disse que não podia mais aguardar
e que iniciaríamos a rescisão. Há uma cláusula de dez dias. Documentamos isso.
Passados os dez dias, nós iniciamos o processo de rompimento.
O Vasco tem direito a algum ressarcimento?
No contrato tem uma multa prevista, e claro que vamos em
busca dos direitos do clube. O Vasco não pode sair prejudicado. Vamos exigir o
cumprimento do contrato com o pagamento da multa rescisória.
O clube fez uma reformulação grande de funcionários, com
diversas demissões. Este processo já foi concluído? Quantas pessoas foram
dispensadas?
Trabalhei muito anos no Vasco, e as pessoas que não
convivem no clube não entendem... O Vasco sempre foi meio paternalista, tem
medo de mandar embora. Acho até louvável, mas temos que preservar a
instituição. A meu ver isso era uma dificuldade. Havia um número excessivo de
funcionários e estamos tentando readequar.
Nessa nossa primeira movimentação, fizemos alguns
ajustes, até para podermos honrar nossos compromissos. Se não me engano, foram
112 demissões. Contratamos em torno de 15. Paralelamente, estamos fazendo
consultorias que vamos apresentar nos próximos dias. A partir desse estudo,
poderemos fazer outros ajustes.
Essa previsão para 2020 é realista ou otimista?
Os problemas não estarão solucionados até lá, mas, se
conseguirmos colocar em prática tudo o que temos planejado, o Vasco estará
equilibrado. Digo 2020 porque é o fim do meu mandato. Ainda estará com dívidas,
mas com equilíbrio. Hoje vemos clubes endividados que tem superávit. Não estão
livres da dívida, mas transformaram ela em longo prazo.
Houve um acordo para parcelar a dívida com o Martín
Silva. Como foi essa negociação?
Estamos honrando as coisas lá de trás também. Foi um
trabalho de toda diretoria. O Fred (Lopes, vice de futebol) é quem trata
diretamente. O Martín é um jogador importante, um líder que tem um papel
fundamental. Mas, independentemente disso, se devemos, queremos pagar. Não
importa a relevância do atleta.
Esse momento de otimismo no futebol te ajuda a tentar
apagar um pouco a má vontade da torcida em relação a você desde a eleição?
Acho que os resultados. Não só isso, mas o trabalho que
tem sido feito vai demonstrando a que viemos e isso vai mudando. De qualquer
forma, acho que essa insatisfação é muito mais de um núcleo politico do que da
torcida. Ando pela rua e vejo muita gente solidária que fala que quer o Vasco
bem. O vascaíno quer ver o resultado.
Desde quando você assumiu, com certeza já respondeu muito
sobre Eurico. Isso te incomoda?
Não me incomoda. Me causa certo espanto, porque é uma
preocupação exarcebada com o Eurico. a preocupação deveria ser muito mais com o
time, como esportivamente o Vasco se comporta e como a gestão atual está
conduzindo o clube, como está se comportando, como tem feito. Acho que é isso.
O vascaíno tem de parar de olhar para trás, tem de olhar para frente. Analisar
seus atos, o que estamos fazendo, e pelos resultados esportivos, financeiros,
econômicos. E vocês são culpados, porque perguntam, dão eco...
Independentemente disso, o Eurico é o presidente do
Conselho de Beneméritos. Qual a importância dele e do poder para o clube?
É um poder do clube. O clube tem cinco poderes, não é só
o residente administrativo. Tem o Conselho de Benemérito, o Fiscal, o
Deliberativo e a Assembleia, que tem um presidente. Tem uma série de coisas que
precisam passar pelo Conselho. Uma série delas precisa passar pelo Conselho de
Benemérito. Por exemplo, se eu resolver ampliar São Januário, isso precisa
passar pelo Conselho. Precisa de aprovação. Muita coisa precisa de aprovação no
Conselho.
Você acha que deturpam a importância de Eurico para o
clube?
Eu acho que as pessoas confundem. Tenho visto muito isso
em comentários. Quando as pessoas tomam conhecimento que ele é o presidente do
Conselho de Benemérito, acham que tem uma atuação na gestão do clube. E não é
verdade. O clube tem cinco poderes. O presidente administrativo sou eu. A
administração do clube cabe a mim. Mas para que haja equilíbrio e uma defesa do
próprio clube existem outros poderes.
Isso não deixa que um presidente comprometa o clube. Para
isso, preciso passar pelo Conselho. Entendeu? Isso é uma defesa ao clube. Se
não, entra alguém aqui com uma administração temerária, com atitudes que
poderiam colocar o clube em risco. É um contraponto. Tem de passar pela
aprovação do conselho.
Mas as pessoas não entendem isso e acham que, pelo fato
de o Eurico ter a presidência de um dos poderes, tem gerência sobre a gestão.
Isso não é verdade. É um mau entendimento da maneira como o clube funciona.
Está no estatuto do clube.
O torcedor ainda pode esperar reforços para a
Libertadores?
Estávamos em busca de alguns nomes, mas as primeiras
tentativas não tiveram êxitos. Os times não quiseram liberar, tinham contrato,
enfim. Mas ainda assim estamos em busca. (Nota da redação: o prazo para
inscrições na fase de grupos termina nesta sexta-feira).
Já foi falado publicamente que o Carlos Leite emprestou
dinheiro ao Vasco no começo do ano, num momento de crise. Você é a favor dessa
relação entre clube e empresário?
O idela é que o clube não precise recorrer a nenhum
recurso, quer seja ele de banco ou de pessoa física ou de quem quer que seja.
Esse é o ideal. Mas no momento em que você não tem tempo hábil nem facilidades
para pegar recursos no banco e nenhuma outra pessoa física disposta a
emprestar, não vejo nenhum problema.
Até porque o que o Vasco fez não foi um empréstimo de
graça para que eu pudesse amanhã ou depois ser cobrado para dar algum retorno.
Foi um empréstimo feito com condições semelhantes às que teríamos com o banco.
Então, estou absolutamente à vontade, porque estarei pagando por isso, porque
não é aquele favor que você faz pensando na frente. Se você me empresta mil
reais e eu faço questão de te pagar os juros, você não pode me cobrar nada.
Isso é um negócio.
Durante a campanha, o senhor havia dito que queria um
valor mais baixo no novo plano de sócios. O que o fez mudar de opinião?
O valor foi o necessário. Existia um pedido para que
fosse aberto, e ele foi aberto. Não é caro. A taxa de adesão é necessária, o
clube precisa de aporte. Pode ser dividida em quatro vezes. Temos que deixar de
hipocrisia, tem muita gente pedindo o valor de R$ 200 que é para reativar um
monte de gente de mensalão. Essa que é a verdade.
O cenário (fez mudar de ideia). Podemos até abrir mais
para eleição, mas quando tivermos de fato um número grande de pessoas
fidelizadas participando. Essa oscilação é um risco para o clube. O Vasco
precisa de sócios que entrem e permaneçam. Toda essa chiadeira talvez tenha
origem na frustração de alguns.
Fonte : ge
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