Quando
o Mundial de Fórmula 1 de 1993 estava para começar, num domingo nublado em
Kyalami, na África do Sul, as atenções estavam voltadas para o reencontro entre
Ayrton Senna e Alain Prost. O francês voltava à categoria depois de um ano sabático
e era o pole position com o velocíssimo carro da Williams. Já o brasileiro, que
confirmara sua participação em cima da hora, às voltas com negociações de
bastidores complicadas, era o segundo no grid após surpreendente desempenho com
a McLaren, a ponto de disputar a pole com Prost. Mas ninguém imaginava que um
garoto de 20 anos que largaria na sétima fila começaria a carreira mais longeva
da história da Fórmula 1.
Há exatos 25 anos, Rubens
Gonçalves Barrichello alinhava sua Jordan-Hart para iniciar uma trajetória que
seria marcada por 322 largadas, 68 pódios, 11 vitórias, 15 poles, dois
vice-campeonatos mundiais, em 2002 e 2004, e seis temporadas na equipe mais
tradicional e famosa do mundo, a Ferrari. Ninguém passou mais fins de semana
guiando um F1 do que Barrichello.
- Nunca imaginei isso tudo!
Eu estava ali nas nuvens, os engenheiros, principalmente o Gary Anderson,
estavam feliz com a minha entrada. Eu cheguei muito bem preparado na F1 apesar
da juventude, preparado em saber desvendar os mistérios de acerto do carro, e
querer melhorar mais. Mas nunca imaginei que seria uma carreira tão legal, e
tão longa! Só tenho a agradecer! - disse Barrichello em entrevista ao
GloboEsporte.com.
Rubinho chegou à Fórmula 1
credenciado por cinco títulos brasleiros de kart, além de ter conquistado
também os campeonatos da Fórmula Opel e da Fórmula 3 Inglesa, e de ter sido
terceiro colocado na Fórmula 3000 (o equivalente hoje à F2) em 1992. Barrichello
assinou contrato com a Jordan, que havia tido excelente estreia na F1 em 1991,
mas só tinha somado um ponto no ano seguinte, após problemas com os motores
Yamaha. A equipe passou a usar unidades da Hart, consideradas confiáveis mas
sem a mesma potência de outros motores. Nesse cenário, não foi possível testar
o carro com regularidade na pré-temporada:
- A gente tentou testar duas
vezes o carro na Inglaterra, mas o carro deu problema, e acabou tendo o mesmo
problema hidráulico que teríamos na África do Sul.
No meio das feras!
Em Kyalami, Rubinho sentiu
de cara que estava no meio das feras. Recepcionado pelo ídolo Ayrton Senna nos
boxes, ele ainda dividiria a pista com nomes do nível de Alain Prost, Michael
Schumacher, Damon Hill, Gerhard Berger, Jean Alesi e Riccardo Patrese.
- Era um sonho. Eu estava
ali vivenciando tudo. O Ayrton passou na frente do box para me cumprimentar. A
África do Sul era a minha primeira corrida, o meu pai (Rubão) estava lá, um
amigo nosso da família que sempre me acompanhou, o tio Plínio, estava lá
também. Foi uma aventura, mas na hora que eu sentei no carro, amei aquela
pista, aquelas curvas 1 e 2 que eram tão rápidas... Foi um sonho dividir a
pista com eles. Tenho uma cena em que eu estava dentro do carro olhando a
televisão e o Ayrton saindo do box dele, e aí quando ele passou em frente ao
meu box, parei de olhar a TV para olhá-lo na real. Era um choque entre fantasia
e realidade! - relembra.
As coisas pareciam andar
bem. Rubinho ficou numa promissora 14ª colocação entre 26 pilotos, superando o
experiente companheiro de equipe Ivan Capelli, que chegava na Jordan após
passagem pela Ferrari. O brasileiro foi o segundo melhor estreante no grid,
perdendo apenas para o nono colocado Michael Andretti, que pilotava uma McLaren
bem mais competitiva.
Na corrida, Barrichello
ganhou três posições antes da primeira curva, mas precisou frear para escapar
de uma grande confusão causada por Hill, e voltou ao 14º lugar. Mas Rubinho aos
poucos foi ganhando posições: subiu para 13º na sexta volta, com 20 voltas já
era o décimo colocado, e chegou a um excelente sétimo lugar, apenas um abaixo
da zona de pontuação da época, na 31ª volta. Foi quando a falta de resistência
da Jordan, que se revelaria o grande problema da equipe durante todo o ano,
deixou Rubinho a pé.
- Eu já estava em sétimo,
atrás do Berger. Meu carro inclusive estava melhor do que o dele, com o
motorzinho não andava tanto para passar - a Ferrari tinha um motor mais forte,
de 12 cilindros. Mas eu estava ali saudável e, vendo o resultado da prova, dava
para terminar entre os seis primeiros. Mas a Fórmula 1 é cheia de
"ses" - admitiu Rubinho.
Numa corrida com muitos
abandonos, Berger acabaria em sexto lugar mesmo tendo o motor Ferrari quebrado
a três voltas do fim. Ou seja, de fato Rubinho tinha boas chances de pontuar
logo na estreia caso tivesse terminado a corrida vencida por Alain Prost, com
Ayrton Senna em segundo.
Carreira de vitórias,
frustrações e longevidade
Mas ainda em 1993,
Barrichello marcaria seus primeiros pontos, com um quinto lugar no Japão.
Pilotaria por mais três anos na Jordan, e depois mais três na Stewart, antes de
assinar com a Ferrari. A épica primeira vitória seria conquistada no GP da
Alemanha de 2000, mas, além de vencer outras provas, Rubinho teria de conviver
com a preferência da equipe italiana por Michael Schumacher, tendo de trabalhar
em favor do alemão em diversas ocasiões.
Saiu da Ferrari no fim de
2005 e teve anos difíceis na Honda de 2006 a 2008. Naquele ano, bateu o recorde
de corridas na F1 no GP da Turquia, superando o italiano Riccardo Patrese. Em
2009, Rubinho renasceu na Brawn GP em 2009, tendo conquistado a centésima
vitória do Brasil na F1, em Valência (Espanha). Barrichello venceu também em
Monza, na que é até hoje a última vitória do país na categoria, e brigou pelo
título com o companheiro Jenson Button até a penúltima etapa. Em 2010 foi para
a Williams, equipe pela qual correu mais duas temporadas.
- Eu amei tudo o que passei.
Tive conversas com outras equipes, tive situações de outras equipes, mas tudo o
que vivenciei foi ótimo para o meu aprendizado, para a minha evolução. E sempre
levei um algo positivo para as equipes. Quando fui repórter da Globo deu para
sentir que sempre deixei as portas muito abertas, mesmo onde não corri. Deixei
um ambiente muito saudável e muito querido. Tem sempre situações em que
queríamos que fosse isso ou aquilo. Mas de todas as dificuldades houve um
aprendizado e uma melhora. Não tenho o que reclamar e só agradecer por esses
anos todos na Fórmula 1, foram sensacionais!
Quarentão forte e feliz!
Hoje, aos 45 anos - Rubinho
faz aniversário dia 23 de maio - Barrichello é uma das estrelas da Stock Car,
com um título em 2014, e sete vitórias. "Rato" de autódromos e
kartódromos, ama o que faz e sempre que pode experimenta outras categorias, já
tendo corrido na Fórmula Indy e disputado as 500 Milhas de Indianápolis, além
de ter participado das duas mais importantes corridas de 24 horas do mundo, em
Le Mans (França) e Daytona (Estados Unidos).
Recuperado de um pequeno
acidente vascular cerebral que o fez ficar internado no começo de 2018, Barrichello
voltou ao automobilismo com um segundo lugar na Corrida de Duplas da Stock Car,
em Interlagos. E, pelo visto, Rubinho ainda tem muito a acelerar pelas pistas
de todo o mundo:
- O amor por guiar é o
mesmo, se bobear é maior hoje. Quando você é um piloto de Fórmula 1 muita coisa
acontece, muita coisa sobe, muita coisa desce. Mas é uma vida intensa, de muito
trabalho de patrocinador, mas muito tempo excelente de pista. Foi uma alegria
muito grande passar esses anos todos, só me fizeram mais fortes para hoje em
dia. E depois dessa prova de Stock Car dá para ver o quanto que estou feliz por
renascer e por ter vivido essa vida maravilhosa, com ainda muita coisa para
acontecer.
Fonte : ge
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