Um padeiro de Angatuba (SP) se prepara há quase um ano para
representar o Brasil no Campeonato Mundial de Pizzas, em Parma, na Itália. Ele
ficou em segundo lugar nas classificatórias nacionais, em 2019, ao apresentar
uma receita que combina a tradição italiana ao tempero do interior.
Frederico Tomé, de 38 anos, conta que tudo começou quando
decidiu trabalhar como padeiro desde 2006. Mas a paixão pela comida veio desde
cedo, ao acompanhar os trabalhos do pai com carne. Ele chegou a se formar em
fisioterapia, mas a culinária falou mais forte e decidiu abrir uma padaria no
centro de Angatuba.
E foi por meio dos pães que Fred, como é conhecido na
cidade, passou a se interessar cada vez mais pela composição de novos sabores.
Passou a estudar a história dos pães italianos para produzir novas receitas por
meio da combinação de fermentos tradicionais com aquilo que descobria em suas
viagens a trabalho.
“O pão italiano é algo que vem da minha vó, eu costumava a
fazer as receitas de família, mas como tenho interesse, passei a estudar,
descobrir outros ingredientes e fornecedores”.
A aproximação com produtores de fermento, farinha e outros
ingredientes resultou em novas oportunidades. Uma marca italiana ofereceu uma
oferta de emprego como representante comercial da no Brasil. Fred passou a
dividir o tempo entre a padaria e viagens divulgando pães feitos com farinhas e
fermentos importados.
“Na padaria, eu fazia pães italianos, ciabattas e outros
pães tradicionais, mas as pessoas queriam mesmo o pão francês. Eu entendo, o
pão francês é maravilhoso e, apesar do nome, traz uma receita que é tipicamente
brasileira. Com o tempo, passei a focar no que vendia e deixei as minhas
criações para as viagens do outro trabalho", acrescenta.
Com a oportunidade, Fred se tornou referência no mercado de
farinhas e fermentos finos, divulgando receitas para produtores de todo o
Brasil. Até que, em 2019, uma das marcas a qual prestava serviço anunciou o
patrocínio de uma das etapas do Campeonato Mundial de Pizzas. Desde 1991, o
evento acontece anualmente em Parma, na Itália.
Ele, então, foi convidado para ser jurado da competição
como especialista em fermentos, mas recusou o convite alegando que não poderia
julgar algo que não provou que sabe fazer.
“Foi complicado. Era a primeira vez que o Brasil recebia um
evento desse porte e a minha resposta soou como desaforo. Disseram que chefs do
mundo inteiro queriam estar no meu lugar e, por eu já ser conhecido, me
perguntaram: e se você ficar em último lugar? Respondi: então vou me preparar
e, em 2020, serei o penúltimo”, comenta.
Pizza in pala com toque do interior
O Campeonato Mundial de Pizzas possui diversas categorias,
desde o melhor pizzaiolo de pizzas clássicas, o melhor em estilo livre, em
teglia (a pizza de forno), napolitana, in pala (feita diretamente na pedra do
forno), pizza gigante e pizza feita em duplas.
Fred concorreu na categoria in pala, um dos tipos mais
consumidos pelos brasileiros. Ele comenta que, nesta modalidade, o que vale é o
formato e não há regras para a criação dos recheios. Para a sua receita,
decidiu que buscaria inspiração no interior.
“Eu queria fazer algo diferente, que respeitasse minhas
raízes. Fui para o Mercadão de São Paulo e disse para mim mesmo: todos os
ingredientes precisam sair daqui”, explica.
Assim, Fred acabou escolhendo uma peça de mortadela
temperada, queijo porongo (tradicional da região) e limões sicilianos. Já a
pitada de mestre encontrou no estacionamento.
“Alguns dias antes, visitei um casal de produtores de
geleia de Angatuba para falar sobre a produção de pães e ganhei uma geleia de
laranja com pimenta que acabou ficando no carro”.
O padeiro olhou para a geleia e decidiu experimentá-la com
a mortadela, dentro do carro. A combinação virou o seu recheio: uma pizza de
massa grossa com o queijo derretido no creme de leite, mortadela flambada,
geleia e rapas do limão.
Cada ingrediente remete a um elemento da região, a opção
pela mortadela flambada e não assada, por exemplo, é para lembrar os aperitivos
servidos nos bares da cidade.
Ele conta que é costume dos mais antigos aquecê-la em cubos
com álcool. Para a massa, optou por uma combinação de farinha de arroz, soja e
trigo. O processo de fermentação leva 12h.
O resultado agradou aos jurados e Fred conquistou o segundo
lugar da competição. Além dele, um paulista e um catarinense também
conquistaram as vagas para a etapa italiana.
Apesar da vitória, os planos da competição foram adiados
pela pandemia de Covid-19. O evento que deveria ter acontecido em agosto de
2020 foi adiado três vezes e deve acontecer em abril de 2021.
O padeiro comenta que teme por mais um adiamento.
Atualmente, a Itália também sofre com medidas restritivas e pode não realizar
evento. Ele já está com a passagem comprada, mas acredita que a demora na
vacinação o impeça de competir.
“Estou com muito medo, já comprei as passagens e estou
esperando para fechar o hotel, porém, sem a vacina não sei nem se poderei
entrar no país”, ressalta.
Pizza, pão ou os dois?
Apesar dos adiamentos, Fred considera que a pandemia também
serviu para aprimorar suas receitas. A competição e o gosto pela pizza o
levaram a estudar novos ingredientes e, durante uma de suas criações, se
lembrou de outra viagem de trabalho que fez para a Itália.
Ao visitar a cidade de Roma, conheceu o conceito da pinsa,
um tipo de pizza feito com massa parecida ao pão ciabatta. Ele brinca que foi a
união de duas paixões, passou a vender as massas congeladas em sua padaria.
Além disso, abriu uma das primeiras “pissarias” do Brasil e
hoje segue dando cursos e escrevendo artigos sobre a produção do alimento.
Do G1
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