As escolas
brasileiras perdem mais tempo com tarefas não relacionadas ao aprendizado e são
ambiente mais propício ao bullying e à intimidação do que a média
internacional, segundo dados obtidos a partir da avaliação dos próprios
professores e diretores escolares. E isso acaba prejudicando os esforços
pedagógicos para melhorar a educação.
Em uma aula típica, os
professores brasileiros passam, em média, apenas 67% do tempo com o processo de
aprendizado – o restante acaba sendo dedicado a tarefas administrativas, como
fazer chamada, ou disciplinares, como manter a ordem da classe.
MAIS DA METADE DOS
BRASILEIROS DE 25 ANOS OU MAIS AINDA NÃO CONCLUIU A EDUCAÇÃO BÁSICA, APONTA
IBGE
A informação é parte da
pesquisa Professores e Líderes Escolares como Eternos Aprendizes (Talis, na
sigla em inglês), que acaba de ser divulgada pela OCDE (Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico).
Na média da OCDE – que
entrevistou 250 mil professores e líderes escolares de 48 países ou regiões –,
os professores usam 78% do tempo de sala de aula com aprendizagem. Atrás do
Brasil, só professores da África do Sul e da Arábia Saudita gastam mais tempo
com tarefas não relacionadas ao aprendizado.
Para a OCDE, o efeito
cumulativo disso traz grandes perdas para o aluno.
"A PERDA DE ALGUNS
MINUTOS POR DIA, SOMADOS, ACABA TOTALIZANDO A PERDA DE VÁRIOS DIAS NO ANO
ESCOLAR, POR ISSO O TEMPO GASTO NO APRENDIZADO É TÃO IMPORTANTE", DIZ À
BBC NEWS BRASIL KARINE TREMBLAY, PRINCIPAL AUTORA DO ESTUDO.
"Um exemplo concreto:
uma perda de apenas 5% no tempo gasto ensinando corresponde a 12 dias e meio no
ano."
A única ressalva que ela faz
é que esse tempo administrativo pode estar sendo positivamente gasto se for
explicando novas tarefas aos alunos ou acompanhando-os em atividades especiais,
como as extraclasse, que tendem a exigir mais tempo de gerenciamento.
INTIMIDAÇÃO E BULLYING
Outro dado que chamou a
atenção de Tremblay é que 28% dos diretores escolares brasileiros relataram ter
testemunhado situações de intimidação ou bullying entre alunos, o dobro da
média da OCDE. Semanalmente, 10% das escolas brasileiras pesquisadas registram
episódios de intimidação ou abuso verbal contra educadores, segundo eles
próprios, com "potenciais consequências para o bem-estar, níveis de
estresse e permanência deles na profissão", diz a pesquisa. A média
internacional é de 3%.
BULLYING: A QUAIS SINAIS OS
PAIS PRECISAM FICAR ATENTOS?
40% DOS PROFESSORES DIZEM JÁ
TER AJUDADO ALUNOS A LIDAR COM BULLYING NA INTERNET
"É claramente uma
questão preocupante e alta para os padrões da OCDE", afirma Tremblay.
"O Brasil não está sozinho – países como a França e regiões como a
comunidade flamenga da Bélgica, também parte da pesquisa – têm índices elevados
(de bullying e intimidação), mas o Brasil está entre os de índices mais altos
do mundo, que têm se mantido estável nos últimos cinco anos."
Tremblay explica que a OCDE
não analisou os motivos por trás desses índices, mas explica que "as
tendências estatísticas mostram que eles são muito sensíveis às políticas
públicas de combate ao bullying".
A pesquisadora explica que,
em muitos ambientes escolares, o bullying e a agressividade acabaram sendo
"normalizados" e minimizados, com impactos negativos sobre o
aprendizado.
"CLARAMENTE, SE OS
ESTUDANTES NÃO SE SENTEM SEGUROS EM SUA PRÓPRIA ESCOLA, NÃO HÁ CONDIÇÕES PARA
APRENDER", DIZ TREMBLAY.
Tremblay opina que é só
quando "todos no ambiente escolar, de pais a educadores e estudantes,
entenderem que essa questão não é aceitável e precisa ser enfrentada é que o
problema será combatido. É preciso informar diretores de que isso é um problema
sério, que afeta o bem-estar e portanto o aprendizado dos alunos, e realizar
campanhas de conscientização para estimular vítimas e testemunhas a relatar os
casos."
PERFIL DOS EDUCADORES
BRASILEIROS
A Talis 2018 – maior
pesquisa mundial de educadores – entrevistou 2.447 professores da educação
básica e 184 diretores de escolas brasileiras.
A média de idade dos
professores brasileiros é de 42 anos e a dos diretores escolares, 46 anos (o
que significa, nos cálculos da OCDE, que um quarto dessa força de trabalho terá
de ser renovada pelo país em pouco mais de uma década, à medida que esses
educadores se aposentarem).
É, majoritariamente, uma
carreira feminina no Brasil: 69% dos professores e 77% dos diretores são
mulheres.
Do total de educadores,
quase dois terços afirmaram que o magistério foi sua primeira escolha de
carreira profissional.
Entre os pontos positivos
destacados pela pesquisa, 80% dos entrevistados brasileiros afirmaram que há
apoio entre colegas para a implementação de novas ideias no ambiente escolar. E
a proporção (33%) de professores novatos brasileiros que contam com a ajuda de
mentores mais experientes - uma prática recomendada pela OCDE – é 11 pontos
percentuais mais alta do que a média internacional.
Para a OCDE, a pesquisa
sobre o universo docente é importante porque a educação atual deixou de ser
relacionada "apenas a ensinar algo a alunos, mas sim a ajudá-los a
desenvolver uma bússola confiável e ferramentas para navegar, com confiança, um
mundo cada vez mais complexo, volátil e incerto".
"O PROFESSOR ATUAL
PRECISA AJUDAR OS ALUNOS A PENSAR POR SI PRÓPRIOS E A TRABALHAR EM CONJUNTO,
DESENVOLVER SUA IDENTIDADE, AGÊNCIA E PROPÓSITO. POR ISSO EXIGIMOS TANTO DOS
NOSSOS PROFESSORES. (...) ESTUDANTES DIFICILMENTE SERÃO ETERNOS APRENDIZES SE
NÃO ENXERGAREM SEUS PROFESSORES COMO ETERNOS APRENDIZES ATIVOS", AFIRMA
TREMBLAY.
Fonte : G1
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